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INTRODUÇÃO
A recolha ora apresentada resulta da experiência docente dos autores leccionando matérias de Direito Público - essencialmente Direito Constitucional - na Faculdade de Direito de Lisboa.
Na génese estão, assim, preocupações pedagógicas onde a Constituição, como texto normativo, deve ser mostrada através das suas concretizações, nomeadamente jurisprudenciais. Julgamos que ignorar a jurisprudência constitucional não é nem mais nem menos do que esquecer que a Constituição existe para ser aplicada, que as normas constitucionais projectam a sua acção reguladora nas situações da vida, que, para usar uma expressão conhecida, para além de um low in the books há também um low in action. Ausente esta dimensão, o cume do ordenamento pode diluir-se num venerável nada.
Os juristas não duvidam do espaço da Constituição na teoria das fontes, nem discutem que as leis e as restantes actos públicos lhe devem obediência. Contudo, afigura-se ainda pouco frequente a sua consulta e utilização em decisões judiciais ou na fundamentação de actos públicos, a partir de um discurso intelectualmente elaborado e tecnicamente correcto. Podem ser várias as explicações de tal esquecimento da Constituição, mas elas reflectem-se sobretudo no seu capítulo material mais importante - os direitos fundamentais -, que vão desde o ínfimo espaço que lhes é atribuído nos curricula universitários, até à progressiva desaparição do pouco que se conseguiu assimilar nas escolas em vidas jurídicas de muita letra e pouco espírito.
Assiste-se hoje, com óbvias vantagens para a comunidade, a uma enorme difusão pública de temas de direitos fundamentais. A intervenção do Tribunal Constitucional começa a fazer parte do quotidiano do espaço público português, como órgão constitutivo do Direito. Isso não resulta só do facto de o catálogo de direitos fundamentais inscrito na Constituição portuguesa ser amplo, nem de ter vindo a ser enriquecido por sucessivas revisões constitucionais. Na realidade, uma grande parte, senão a mesma maioria, das controvérsias constitucionais que surgem na comunidade têm a sua origem no domínio dos direitos fundamentais, seja ao nível da definição dos direitos, seja no que se refere ao complexo tema das restrições e colisões.
Pensamos que este conjunto de dez acórdãos do Tribunal Constitucional pode contribuir para a formação de futuros juristas, transmitindo-lhes uma ideia do Direito como problemática, arredado de viciantes minutas ou estafados formulários. Acham-se neste trabalho acórdãos essencialmente posterior a 2000, encontrando--se em todos eles referências para jurisprudência anterior. Preferiu-se, assim, incluir decisões consolidadas a decisões históricas ou seminais. Os acórdãos respeitam a direitos, liberdades e garantias e a direitos, económicos, sociais e culturais, a processos em que o Tribunal decidiu no sentido da inconstitucionalidade e a outros em que a decisão foi inversa, a decisões unânimes ou tiradas por maioria. Por exemplo, questões como a interrupção voluntária da gravidez ou o ensino de moral e religião católica nas escolas públicas são, também, temas de controvérsia constitucional, onde o Tribunal, como outros órgãos com estas características, se divide.
Pela leitura dos acórdãos propostos pode descobrir-se pertinência constitucional na obrigação de se apresentar ao serviço barbeado ou no pagamento de propinas. Transmitir a dimensão dos direitos fundamentais e o quanto eles nos estão próximos na vida de todos os dias traduz o propósito dos autores.
A recolha inclui o texto completo dos acórdãos, sendo seguida de um grupo de questões a debater sobre temas específicos da decisão, e de outros relativos a princípios gerais de Direito Constitucional.
Lisboa, Junho de 2006
Alexandre Sousa Pinheiro
Pedro Lomba